Home Resenhas Cabine de Imprensa – Masha (Masha) – 84 min
Cabine de Imprensa – Masha (Masha) – 84 min
desconexao leitura setembro 11, 2021 0
“Paraíso / Eu estou no paraíso / E meu coração bate tanto que eu mal
posso falar / E eu pareço encontrar a felicidade que procurei / Quando nós
estamos juntos lá fora dançando de rostos colados”
(Cheek to Cheek, canção de Irving Berlin)
“Quand
il me prend dans ses bras / Qu’il me parle tout bas / Je vois la vie em rose /
Il me dit des mots d’amour / Des mots de
tous les jours / Et ça me fait quelque chose (…) C’est lui pour moi / moi pour lui / Dans la vie / Il me l’a dit, l’a juré
/ Pour la vie”
(La Vie em Rose, canção de Edith Piaf)
Maria Konstantinovna, Masha (a ótima Anya Chipovskaya), volta
para sua cidade natal para acertar as contas. Agora ela é uma cantora de
prestígio, mas em sua antiga morada participava de um grupo social muito
complicado. A vida é difícil para uma
moça de treze anos na nova Rússia, ainda mais se sua família é um tanto
mafiosa, envolvida com toda sorte de truculências. Roubam, cometem pequenos
crimes, matam. Para eles isso tudo faz parte do dia a dia dos negócios. Essas
pessoas amam Masha e a protegem sempre com muito carinho: “Ela vai ser melhor
que nós, mais livre...”. Essa cantilena é dita mais de uma vez, embora seus
parentes, a não ser sua mãe, nada façam para que esse destino aconteça. Seu
tio, o Padrinho (o excelente Maksim Sukhanov), ou seja, o chefão do clube de
boxe (a gang), a paparica de muitas maneiras. A doce menina, vez por outra pega
o revolver dele ou de algum dos rapazes e brinca com a arma como se fosse coisa
inocente.
A pequena Masha (a incrível Polina Gukhman) acaba testemunhando
algumas das atrocidades que o bando comete. E as que os inimigos cometem contra
ele. Sente as perdas de seus amigos queridos, mas aquele é o mundo que ela
conhece. Matar é assustador? Valera, o tio, reponde-lhe que é possível
sobreviver a qualquer morte, que quem é vivo sempre está certo. Assim são os
tempos atuais, é matar ou morrer. Espécie de Filosofia na sarjeta.
O filme mostra o lado humano daquelas pessoas, apesar de suas
vidas bandidas. Um capanga escreve poemas, outro chora no cinema. No entanto,
todos acham que resolvem tudo na porrada. A violência criminosa implica também
a negação de certos valores. O deserto de sentimentos está logo ali à espreita.
O perigo tem seus mistérios: revela sensibilidades, desejos e a paixão, Masha e
Serguei. Poesia, música, amor. Temas paralelos, ou subtemas atuantes. O final
reserva fortes emoções. Paradoxais. E trágicas. Uma espécie de Electra musical.
As canções são uma constante ao longo do filme. Em inglês,
principalmente, em francês e em russo. Quase sempre é Masha, jovem ou adulta,
quem canta. As músicas pontuam cenas fortes, acentuando o conteúdo delas por
afinidade ou por contraposição. A menina, quando consegue sair dali, constrói
uma carreira musical. Mas só ficamos sabendo disso no final.
O Vermelho é uma cor quente, tem muitos significados: paixão,
raiva, fúria, desejos intensos e incontroláveis, forte excitação, força e
vitalidade, poder de realizar qualquer ato. Dizem que é a cor mais intensa da
psicologia. O Vermelho é outra constante do filme: está na cor do vestido de
Masha no palco, no sangue derramado por camaradas e gangs rivais, na chegada da
primeira menstruação (embora aí apenas aludido), em ambientes e vestes de
vários personagens. As cenas noturnas, de um modo geral, tem uma paleta de
cores que vai do vermelho à vários tons próximos. Marrom, ocre, sienna... Uma
iluminação sempre muito bem cuidada, resultando numa fotografia muito bonita.
Não por nada o Vermelho acompanha muitos momentos da jovem Masha. Até o filme
que ela assiste, junto com um dos matadores do tio, tem como personagem central
Scarlett O’Hora.
Outra constante é Masha caminhando pelos corredores da
existência, sempre vista de costas, se surpreendendo com os perigos de sempre,
tateando aquele mundo incompreensível e brutal. Está presente, duplamente, na
sequência final (que é uma volta ao início do filme). Na cena ela entra, canta Cheek to Cheek, realiza uma coreografia
agitada, pula, pira, dança exultante numa performance bipolar no palco e na
vida. Há um belíssimo movimento de câmera, que a acompanha pelas costas,
circula-a e a mostra de frente. De frente para o público, de frente para o
crime. Sentimentos ambivalentes de quem vivenciou todos aqueles absurdos. Ela
canta “Heaven... I’m in Heaven...”
“Masha” (Masha) – Rússia – Drama – 2020 – 84 min
Direção: Anastasiya Palchikova
Fotografia: Gleb Filatov
Figurinista: Anna Christova
Maquiagem: Kristina Bitiutskaya
Produtor musical: Denis Dubovik
Diretor de elenco: Vladimir Gelov
Diretor de arte: Valeriy Todorovskiy
Chefe decorador: Asya Davydova
Assistente de direção: Ksenia Kukina
Montagem: Ivan Baryshev (com a participação
de Mukharam Kabulova)
Som: Aleksandr Volodin e Konstantin
Zalesskiy
Elenco: Maksim Sukhanov – Anya Chipovskaya
– Polina Gukhman – Aleksandr Mizev – Olga Gulevich – Maksim Saprykin – Sergey
Dvoynikov – Olya Fedotova – Aleksandr Zvezdin – Anna Borissowna
Marco Guayba
Ator, diretor,
preparador de elenco e Mestre em Letras
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