Home Teatro [Teatro] Crítica Espetáculo Dentro
[Teatro] Crítica Espetáculo Dentro
desconexao leitura maio 01, 2019 0
A estreia do espetáculo teatral Dentro do dramaturgo Diogo Liberano, com a direção de Natássia Vello
e atuação de Laura Nielsen teve início na sala de teatro mais intimista
do Centro Cultural do Banco do Brasil no Rio de Janeiro no dia 24 de abril
de 2019. A escolha do espaço que conta com apenas 86 cadeiras, e onde o
palco é somente a demarcação feita no chão, e o cenário é simples, mas
eficaz para os fins da peça já diz muito sobre a intencionalidade da
personagem, que é tomar um café –literalmente- com a plateia, nos
puxando e levando-nos a refletir ainda mais intimamente sobre as
diversas questões ali propostas.
Questões interessantes são trazidas à
tona, tanto temas atuais quanto alguns que já vem sendo desconstruídos e
questionados ao longo do tempo. Fazemos uma viagem lúdica em que a
atriz Laura Nielsen interpreta Leonor e todos os outros flashbacks de
suas antepassadas e dos momentos que levantarão essas questões. Esta
transição de uma para outra fora um pouco confusa e não muito clara
sobre quando Leonor era Leonor ou uma outra mulher de sua família, porém
entendo também que talvez isso fizesse parte da construção dessa
personagem tão complexa e perdida na falta e no excesso de memória que
aquele momento traz. A evidência dessa confusão organizada que deixa o
expectador participante sem fôlego é afirmada pela própria Leonor quando
ela critica seu querer saber de tudo e suas perguntas infinitas serem
taxadas como loucura ou desequilíbrio, assim como a maioria das mulheres
são vistas ao não se comportarem da maneira padronizada que a sociedade
espera e exige. Sociedade essa que nos faz fiscais umas das outras e
que faz de nossas mães, principalmente, as percussoras desses
pensamentos através de nós para que façamos o mesmo com nossas filhas e
assim por diante em uma corrente infinita de padronização normatizada.
Através
de Leonor é possível ver como padrões sociais se repetem e como de
pouco em pouco as mulheres de sua família foram quebrando-os de sua
maneira e dentro do possível, ganhando reconhecimento só ao final da
peça quando a personagem principal percebe que por mais que elas não
tivessem quebrado todas as convenções e paradigmas em seu tempo, elas
merecem sim o crédito pelo que fizeram para contribuir. Leonor também
lamenta que diversas situações apenas se repetiram por repetir, como por
exemplo: casar, ter filhos, cuidar da casa, coisas estas que aquelas
mulheres fizeram sem talvez questionar ou se perguntar se era mesmo
somente aquele o papel feminino. Até que, como disse, com o coração mais
leve ela compreende que a multiplicidade feminina deve ser valorizada
seja ela qual for, mas antes de tudo ela afirma que felicidade e amor
devem ser os motivos primordiais para qualquer um destes.
A
problemática da desvalorização da memória, da não valorização do
passado é trazida também fora deste contexto feminino quando a
personagem faz uma referência inteligente e indireta a dois museus que
pegaram fogo no Brasil- há quarenta anos atrás o Museu de Arte Moderna
do Rio de Janeiro e tão recentemente o Museu Nacional – e sobre a
população brasileira que assiste sua história sendo apagada, apenas
chorando após o ocorrido poucas lágrimas de quem não vê que o futuro só
existe porque previamente houve um passado, e como o reconhecimento
deste fato nos ajudaria a não repetir os mesmos erros que nossos
antepassados.
Em
uma jornada curta de uma peça foi possível ver e sentir o turbilhão de
emoções e momentos de tantas mulheres de épocas tão diferentes, o que é
sem dúvida de uma complexidade enorme. Mas principalmente mais do que
histórias do passado, a peça instiga o autoconhecimento por meio do
estudo deste, nos lembrando que não é necessário ser o que ninguém
deseja além daquilo que você deseja para si mesmo. Leonor encerra sua
jornada dizendo que entende como todas são parte dela, assim como
ela também é apenas ela própria ao fazer suas escolhas. Fazendo-nos
sentir que temos uma amiga que compartilha e deixar fluir nossas
chamadas loucuras e nos incentiva a usufruir desta para uma manutenção
mais saudável do que é existir e se conhecer, do que é ser mulher.
Lívia Winter
Graduanda em Produção Cultural
ACESSE TAMBÉM NOSSAS REDES SOCIAIS
Assinar:
Postar comentários
(
Atom
)
Postar um comentário