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[CRÍTICA] Temporada
desconexao leitura janeiro 27, 2019 0
“Só uma maneira de interromper, só a maneira de sair – do fio, do rio, da roda, do
representar sem fim.” (Guimarães Rosa)
O filme “Temporada”, grande vencedor do 51º Festival de Brasília (melhores filmes, atriz, ator coadjuvante, direção de arte e fotografia), narra as peripécias singelas de Juliana Campos, suas desventuras, suas descobertas de vida e, digamos, sua ressurreição. Vinda de Itaúna, bem nos fundões de Minas Gerais, ela se vai a trabalhar numa equipe de combate a endemias em Contagem. Através de sua jornada diária de casa em casa, para eliminar focos da dengue, tomar um cafézinho passado na hora e testemunhar outras vidas, vemos um pouco dos hábitos e costumes de maneiros mineiros, de seus modos e falares, e um tempo singular repercutido pelo ritmo próprio do filme . E o cão, os cães, as ladeiras de Minas, de Minas em mim. Em você. Em qualquer um que algum dia já lá esteve.

A querência da vida se mostrando no cotidiano. A mudança de cidade requer outra postura, uma atitude de conferir um real indevassado. O mesmo.Redescoberta ou tentativa de fantasia na vida ela mesma. A moça mora sozinha em um cubículo com nada de conforto, e se enrtetém com um nadinha de brincadeira, uma música no celular que ela coloca dentro de um balde para aumentar o som. Vai aí o som na lata.
Sua dor aparece numa das melhores cenas do filme. A excelente atriz Greice Passô confere força à sua confissão-relato, ou melhor, da personagem. Lembramos de Guimarães Rosa que, em um de seus contos, faz uma personagem dizer sobre a arte do ator: “Representar é aprender a viver além dos levianos sentimentos, na verdadeira dignidade”. E a dor só se ausenta, ou dormita de boba, se se puder falar dela. Nos verdadeiramente causos em que é emoldurada, proseada, enfileirada sem protocolo nenhum. Nem farsa de enganar o bobo de si.
A câmera fixa, nesta obra, presente em quase todo o filme – forma de fazer cinema que busca conformar um observador neutro, alheio à cena, que testemhunha casualmente um acontecimento como algo que acontece, pois para tal estética a vida é o que acontece -, potencia uma certa nostalgia, uma sensação mais ou menos difusa de uma melancolia que emerge cena a cena por ressaltar o outro inacessível em um filme em que o ofício de esculpir o tempo, ou carpir a angústia, alia-se a um querer assim captar uma realidade recortada, intensa, mas que lhe escapa, como o saber o que a vida é escapa, inexorávelmente, a qualquer um de nós.

Perto do final, Juliana conta que ficou sem falar uns dois ou três anos quando era criança, a vizinha de 80 anos se aquietou dela, contava-lhe histórias, um dia há fumaça na casa dessa senhora, menina-ela grita. Pronto, voltou a falar e se tornou a personagem desse filme singular.

“Temporada” - 2018 – 1h 53 min. - Brasil
Direção: André Novais Oliveira
Fotografia: Wilssa Esser
Direção de arte: Diogo Hayashi
Roteiro: André Novais Oliveira
Música: Pedro Santiago
Com: Grace Passô (Juliana) – Russo Apr (Russão) – Rejane Faria – Hélio Ricardo – Ju Abreu – Renato Novaes – Sinara Teles – Janderlane Souza
Trailer: https://youtu.be/LGMZrH53UHo
Marco Guayba
Ator, diretor, preparador de elenco e Mestre em Letras
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